O natal e a fantasia é importante em qualquer idade, desde que, todavia, não seja posta como substituta, como panaceia, como derivativo da nem sempre suave (pelo contrário, às vezes aspérrimas) realidades. É gostoso curti-la, sim, e quanto mais, melhor. Desde que, porém, na medida correta e nunca enganados. Ou seja, tendo em mente que ela é fruto exclusivo da nossa criatividade, mera abstração e nada mais.
Desde que me tornei pai pela primeira vez e quis a Providência que eu tivesse o privilégio de passar por três vezes pela mágica experiência de ser pai, decidi que jamais, em circunstância alguma, fosse em que assunto fosse, eu mentiria para meus filhos. E sempre cumpro isso com determinação.
Desde que tinham pouca cumplicidade que raros conseguem criei um elo de completa confiança mutua. Eles confiaram em mim e eu neles. Agora pequenos aborrecentes e uma quase mulher, por maior que fossem as bobagens que cometessem, sempre que interrogados, confessam as, sem nenhum subterfúgio ou tentativa de negação. Acabam perdoados, quando as faltas são graves, ou elogiados pela sinceridade, nos pecadilhos, digamos, sem prejuízos para terceiros. E isso sempre funcionou.
Meus filhos acreditam, sem a menor vacilação, em tudo que lhes falo, pois estão convictos que eu jamais lhes mentiria (e nunca lhes menti mesmo) e vice-versa. Por isso, a maneira como a figura emblemática do Natal, a do Papai Noel (criação de uma agência de publicidade norte-americana, que data de 1928, inspirada na figura de Saint Nicolas, destinada a promover o refrigerante Coca-Cola) sempre foi tratada, aqui em casa, é diferente da maioria.
Agora que começaram a entender as coisas, lhes explico que se tratava de mero símbolo, que não existia de fato, mas que nem por isso eles deixassem de curtir essa fantasia e melhor, que aproveitassem a brincadeira para se alegrar. E eles aceitaram isso numa boa.
Nunca me vesti de Papai Noel, risos, para entregar presentes, até porque me sentiria ridículo naquela fantasia vermelha, calorenta e inapropriada para mim e como sou cachorrão, iria latir, au, au, au , au iria espantar as gatinhas, risos... Mas outros fazem e levo de boa. E as crianças levam a coisa numa boa também. Adoraram fazer teatro e fingir que acreditavam nele.
Recebem o “bom velhinho”, como se ele fosse real. Hoje aqui em Mônaco no dia do meu aniversário até eu, soltei um “Ho ho ho! Joyeux Noël " Como se acreditasse mesmo, que ele havia vindo da Lapônia, passear em Mônaco ville na Cote d’ Azur num incrível trenó voador, puxado por renas mágicas, que sabiam voar. Chique né, nós parece banana , mas é culto e bacana.
As crianças não estragaram a brincadeira, pelo contrário... Mas pilho, em algumas ocasiões, as crianças mais velhas explicando às mais novas a diferença entre fantasia e realidade, o que tive o cuidado de reforçar. E assim os meus filhos crescem. Ou seja, nunca abriram mão dos sonhos e ilusões, mas sempre tendo em vista que alguns são o que serão, irreais.
Recebi inúmeras críticas amigos e até de desafetos, por minha suposta incoerência. Alguns me dizem - “ Onde já se viu um sujeito que vive criando fantasias em poesia e escreve tanta “merlinn e safadex”... ser um pai a matar os sonhos e ilusões das crianças! ” Claro que essas pessoas confundem as coisas. Aliás, nunca me entenderam e muito menos o meu procedimento e por mais que neguem, creio que não gostam de mim. Não faz mal.
Não matei, em momento algum, as fantasias dos meus filhos. Apenas, limitei-me a dizer-lhes a verdade. E, acima de tudo, ensinei-lhes a distinguir o que é somente imaginado do que realmente existe.
Na verdade, estimulei as duas coisas, que julgo importantíssimas para uma personalidade equilibrada, bem-formada e feliz. Ou seja, que as crianças criem sim, fantasias, e não apenas uma ou duas, mas quantas sua criatividade permitir, ponderando, porém, que sempre tenham o cuidado de dar-lhes o devido peso. Que jamais confundiam o real com o imaginário, portanto essa confusão tem um nome próprio: alienação.
Por isso que amo tanto meus bebes: por suas sabedorias e sagacidade, muito superiores às nossas, adultos, estejamos ou não dispostos a admitir essa superioridade, quase nunca admitida por nós, esquecidos, aliás, de como fomos em nossa meninice. Elas são o futuro do mundo e, principalmente, a esperança da humanidade. E a esperança, como ressaltou judiciosamente Machado de Assis, no romance “Esaú e Jacó”, é “a meninice do mundo”.
Não por acaso o Natal nada mais é do que uma comemoração já bimilenar ao nascimento de uma criança absolutamente especial, a nos lembrar e às várias gerações que somente assumindo a inocência e a pureza desses pequeninos seres, acharemos a chave da verdadeira sabedoria , tão procurada onde ela nem está, que é a felicidade!